Estudo revela que arrependimentos sociais lideram causas da “ressaca moral” entre consumidores de álcool.
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Uma pesquisa recente realizada pelo Instituto Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), a pedido do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (Cisa), revelou que muitos brasileiros já vivenciaram momentos de arrependimento decorrentes do consumo de bebidas alcoólicas. Desde dizer algo indevido até ligar para ex-companheiros, perder objetos e faltar a compromissos no dia seguinte, essas situações indesejadas são o que popularmente se conhece como “ressaca moral”.
O estudo aponta que a maioria dos entrevistados que relatou esses arrependimentos experienciou tais momentos principalmente nos primeiros contatos com o álcool. No entanto, atualmente, muitos deles procuram evitar essas situações, embora alguns, especialmente os consumidores abusivos e jovens, admitam que ainda ocasionalmente exageram no consumo de bebidas alcoólicas.
Surpreendentemente, a pesquisa destaca que a maioria das ocorrências de embriaguez não é intencional, já que os níveis de ebriedade são atingidos sem que o indivíduo perceba. Esse fenômeno também é comum entre os consumidores abusivos, que relatam dificuldade em perceber quando ultrapassam os limites.
Os relatos sobre a ingestão excessiva de álcool e os arrependimentos associados a ela giram em torno de situações que normalmente causam vergonha e que poderiam ser evitadas caso o consumo de álcool não tivesse ocorrido. Os principais motivos para o arrependimento não estão relacionados à saúde, mas sim ao medo de manchar a reputação social. Alguns dos arrependimentos mais citados pelos entrevistados incluem dizer algo inadequado aos amigos, ligar para ex-parceiros, perder dinheiro ou objetos, trair o parceiro amoroso e faltar a compromissos de trabalho após uma noite de bebedeira.
A pesquisa aponta que o consumo abusivo de álcool está fortemente ligado à sociabilidade dos jovens, pois muitos deles acreditam que beber os ajuda a interagir melhor com os outros. O medo de ser julgado socialmente e a censura são as principais consequências desse comportamento, e não tanto o medo das consequências biológicas à saúde. No entanto, os entrevistados não relataram mudanças significativas no comportamento em relação ao consumo de álcool após episódios de arrependimento.
Mariana Thibes, socióloga e coordenadora do Cisa, destaca que o álcool desempenha um papel relevante na sociabilidade dos jovens, e as preocupações e riscos percebidos estão diretamente relacionados a esse aspecto de suas vidas. Além disso, o raciocínio de longo prazo não é comum nessa fase da vida, o que faz com que problemas de saúde que surgem mais tarde não estejam no radar dos jovens.
Por outro lado, os consumidores moderados de álcool afirmam que bebem de forma consciente e raramente exageram a ponto de se arrependerem ou sentirem mal-estar. O medo de passar por situações embaraçosas e do desconforto pós-consumo funciona como um freio para o consumo excessivo.
Uma parcela minoritária dos participantes da pesquisa declarou ter passado por mudanças de comportamento após terem bebido demais, como evitar a bebida que causou a experiência traumática, não misturar diferentes bebidas alcoólicas após passar mal, não beber e dirigir após acidentes envolvendo amigos ou conhecidos e reduzir a quantidade de álcool ingerida.
Outro achado interessante da pesquisa é que as pessoas que têm práticas de consumo abusivas, especialmente homens, não se veem como excessivas. Na percepção deles, são sempre os outros que bebem mais, e muitos acreditam que são consumidores moderados em relação à frequência de consumo.
A pesquisa “Álcool e a Saúde dos Brasileiros: Panorama 2023” entrevistou 1.983 pessoas, e os dados foram projetados para a população brasileira com 18 anos ou mais. A margem de erro foi de no máximo dois pontos percentuais, com 95% de intervalo de confiança. A pesquisa lança luz sobre a relação complexa que os brasileiros têm com o álcool, destacando a importância de políticas públicas e conscientização sobre o consumo responsável.